sábado, 9 de maio de 2009

Encontros e trocas


Imaginando que possamos trocar experiências entre as diferentes formas de “aprender” e de “ensinar” – em diversos outros espaços que não o acadêmico (das universidades) , mas também aonde o desejo nos leva; decidi postar aqui o texto de apresentação do grupo de estudos em Psicanálise e Linguistica de autoria da professora Maria Cláudia Maia (psicanalista, doutora em Letras pela PUC-RJ:
“Significante e significado, divididos pela barra da significação, compõem o que Saussure denomina de signo lingüístico. Lacan, leitor de Saussure, inverte o algoritmo e dá ao significante um valor supremo e separado do significante pela barra do recalque.
A Linguística se funda na existência da metalinguagem, mas o axioma lacaniano afirma o contrário: a metalinguagem não existe. O campo da Lingüística, então, desaparece? Por outro lado, Lacan não se utiliza do arcabouço lingüístico para trabalhar conceitos como inconsciente, letra, enunciado, enunciação, metáfora, metonímia, sujeito etc?
Poderíamos pensar, então, que o axioma sobre a não existência da metalinguagem é necessário para dar consistência à teoria lacaniana do significante?
Essas e outras questões serão estudadas e discutidas de modo a precisarmos em quais pontos Lacan se aproxima e se distancia do discurso da Lingüística. Além da referência à Lingüística, pretendemos, no correr do trabalho, promover articulações com o campo da Literatura através de textos de Joyce, Beckett e Virginia Woolf.

Referências Bibliográficas:
Arrivé, M. “Linguagem e Psicanálise, Lingüística e Inconsciente: Freud, Saussure, Pichon, Lacan”.
________. “Lingüística e Psicanálise: Freud, Saussure, Hjelmslev, Lacan e os outros”.
Benveniste, È. “Observações sobre a função da linguagem na descoberta freudiana”.
Brasil, I.E.A.do. “Da letra da clínica à clínica da letra”.
Campos, H. “Metalinguagem”.
Freud, S. “As afasias”.
______. “O inconsciente” (apêndice 3: “Representação de coisa e representação de palavra”).
______. “O sentido antitético das palavras primitivas”.
Jakobson, R. “Dois aspectos da linguagem e dois tipos de afasia”.
Lacan, J. “Função e campo da fala e da linguagem em psicanálise”.
______. “A instância da letra no inconsciente ou a razão desde Freud”.
______. “Seminário sobre a carta roubada”.
Miller, J-A. “U ou ‘il n’y a pas de métalangage’”.
Milner, J-C. “O amor da língua”.
________. “A obra clara”.
Saussure, F. “Curso de lingüística geral”.
Zizek, S. “O circuito da liberdade”.

Construindo o discurso segundo Michael Foucalt


Para Michel Foucault, é preciso ficar (ou tentar ficar) simplesmente no nível de existência das palavras, das coisas ditas. Isso significa que é preciso trabalhar arduamente com o próprio discurso, deixando-o aparecer na complexidade que lhe é peculiar. E a primeira tarefa para chegar a isso é tentar desprender-se de um longo e eficaz aprendizado que ainda nos faz olhar os discursos apenas como um conjunto de signos, como significantes que se referem a determinados conteúdos, carregando tal ou qual significado, quase sempre oculto, dissimulado, distorcido, intencionalmente deturpado, cheio de .reais. intenções, conteúdos e representações, escondidos nos e pelos textos, não imediatamente visíveis. É como se no interior de cada discurso, ou num tempo anterior a ele, se pudesse encontrar, intocada, a verdade, desperta então pelo estudioso.

Para Foucault, nada há por trás das cortinas, nem sob o chão que pisamos. Há enunciados e relações, que o próprio discurso põe em funcionamento. Analisar o discurso seria dar conta exatamente disso: de relações históricas, de práticas muito concretas, que estão .vivas. nos discursos. Por exemplo: analisar textos oficiais sobre educação infantil, nessa perspectiva, significará antes de tudo tentar escapar da fácil interpretação daquilo que estaria .por trás. dos documentos, procurando explorar ao máximo os materiais, na medida em que eles são uma produ-
ção histórica, política; na medida em que as palavras são também construções; na medida em que a linguagem também é constitutiva de práticas.

Então declara-se nesse caso a completa autonomia do discurso, o reino absoluto e independente das palavras? O discurso organizaria a si mesmo, inclusive as práticas sociais? Talvez as obras foucaultianas da década de 60 . As Palavras e as coisas e A Arqueologia do saber ., como registra David Couzens Hoy (1988), sugerissem essa concepção idealista e estruturalista da linguagem, o que inclusive foi admitido por Foucault. Porém, a idéia de categorias universalmente constitutivas, próprias do estruturalismo e do idealismo filosófico, jamais se ajustou ao projeto maior do filósofo. Segundo Dreyfus e Rabinow (1984), ele desejava demonstrar exatamente o contrário, ou seja, a inexistência de estruturas permanentes, responsáveis pela constituição da realidade. A conceituação de discurso como prática social . já exposta em A Arqueologia, mas que se torna bem clara em Vigiar e punir e na célebre aula A Ordem do discurso . sublinha a idéia de que o discurso sempre se produziria em razão de relações de poder. E, mais tarde, nos três volumes de sua História da sexualidade, o pensador mostra explicitamente que há duplo e mútuo condicionamento entre as práticas discursivas e as práticas não discursivas, embora permaneça a idéia de que o discurso seria constitutivo da realidade e produziria, como o poder, inúmeros saberes. Na verdade, ele falou disso desde o início de suas investigações; em A Arqueologia do saber o mesmo assunto aparece sob a forma de reflexão sobre o trabalho realizado e sobre projetos futuros:

...gostaria de mostrar que o discurso não é uma estreita superfície de contato, ou de confronto, entre uma realidade e uma língua, o intrincamento entre um léxico e uma experiência; gostaria de mostrar, por meio de exemplos precisos, que, analisando os próprios discursos, vemos se desfazerem os laços aparentemente tão fortes entre as palavras e as coisas, e destacar-se um conjunto de regras, próprias da prática discursiva. (...) não mais tratar os discursos como conjunto de signos (elementos significantes que remetem a conteúdos ou a representações), mas como práticas que formam sistematicamente os objetos de que falam. Certamente os discursos são feitos de signos; mas o que fazem é mais que utilizar esses signos para designar coisas. É esse mais que os torna irredutíveis à língua e ao ato da fala. É esse .mais. que é preciso fazer aparecer e que é preciso descrever. (Foucault, 1986, p.56)

Na verdade, tudo é prática em Foucault. E tudo está imerso em relações de poder e saber, que se implicam mutuamente, ou seja, enunciados e visibilidades, textos e instituições, falar e ver constituem práticas sociais por definição permanentemente presas, amarradas às relações de poder, que as supõem e as atualizam. Nesse sentido, o discurso ultrapassa a simples referência a .coisas., existe para além da mera utilização de letras, palavras e frases, não pode ser entendido como um fenômeno de mera .expressão. de algo: apresenta regularidades intrínsecas a si mesmo, através das quais é possível definir uma rede conceitual que lhe é própria. É a esse .mais. que o autor se refere, sugerindo que seja descrito e apanhado a partir do próprio discurso, até porque as regras de formação dos conceitos, segundo Foucault, não residem na mentalidade nem na consciência dos indivíduos; pelo contrário, elas estão no próprio discurso e se impõem a todos aqueles que falam ou tentam falar dentro de um determinado campo discursivo (Foucault, 1986,
p.70).

O teórico Ernesto Laclau explicita muito bem esse conceito de discurso, pelo qual os atos de linguagem constituem uma trama que ultrapassa o meramente lingüístico. Para ele, o discurso seria uma instância limítrofe com o social. .Porque cada ato social tem um significado, e é constituído na forma de seqüências discursivas que articulam elementos lingüísticos e extralingüísticos. (Laclau, 1991, p.137). Segue daí uma nova conceituação de objetividade (as práticas sociais se constituiriam discursivamente), bem como um modo novo de conceber as identidades sociais ou subjetivas, mergulhadas num relativismo bastante radical, dado por esse
jogo permanente dos sentidos. Para Laclau, a sociedade seria assim entendida.como um vasto tecido argumentativo no qual a humanidade constrói sua própria realidade. (idem, p.146).

Afirmar que os discursos formam os objetos de que tratam ou, como Laclau, que não se pode falar em .realidade objetiva. sem entender que esta se constrói por dentro de uma trama discursiva, pode à primeira vista significar uma opção idealista, conforme mencionamos anteriormente. No entanto, além de o conjunto da obra de Foucault demonstrar o contrário dessa opção, pode-se dizer da.positividade. desse suposto radicalismo que o leva a quase afirmar a completa autonomia dos discursos: sua insistência em negar teorias totalizantes de explicação da realidade social, bem como de negar uma visão de .progresso. científico ou progresso da razão, de superioridade do presente em relação ao passado, faz com que Foucault .revolucione a história., como diz Paul Veyne. Ele se define como um historiador do presente, por inquietar-se profundamente com o que nos sucede hoje, e se entrega a perscrutar a genealogia dos grandes temas constituintes do homem ocidental, através da descrição minuciosa de práticas sociais em sua descontinuidade histórica . mergulhadas em relações de poder, produzidas discursivamente e ao mesmo tempo produtoras de discursos e de saberes. Basicamente, tais temas dizem respeito à fixação em saber a verdade do sujeito, em constituir os sujeitos como o lugar da verdade, em construir para todos e cada um de nós discursos .verdadeiros.
Continua em "FOUCAULT E A ANÁLISE DO DISCURSO
EM EDUCAÇÃO" de ROSA MARIA BUENO FISCHER
www.scielo.br/pdf/cp/n114/a09n114.pdf

sábado, 4 de abril de 2009

O sujeito do discurso e a subjetivação


O sujeito da Análise do Discurso não é o cartesiano dos tempos áureos do iluminismo. Descartes (1596-1650) projetou um homem dono de si, senhor de seu próprio destino, consciente de suas ações e desejos, capaz de conhecer a verdade e alcançar a felicidade através da razão. O sujeito da Análise do Discurso não é o sujeito das Ciências Exatas, que se diz capaz de explicar o objeto através de um conhecimento imparcial. Um sujeito que está no exterior da realidade pesquisada e que observa o fenômeno com a distância suficiente para assumir um comportamento neutro diante do fato. O sujeito da Análise do Discurso também não é o da Lingüística Clássica, que o concebe ora como idealizado, ora como mero falante. O sujeito idealizado baseado na crença de que todos os falantes de uma mesma comunidade falam a mesma língua. O sujeito falante é o empírico, o individualizado, que “tem a capacidade para aquisição da língua e a utiliza em conformidade com o contexto sociocultural no qual tem existência” (FERNANDES, 2005, p. 35). Muito menos é o sujeito da Gramática Normativa que o classifica em simples, composto, indeterminado, oculto e inexiste. O sujeito do discurso não pode estar reduzido aos elementos gramaticais, pois ele é historicamente determinado. Na Análise do Discurso, para compreendermos a noção de sujeito, devemos considerar, logo de início, que não se trata de indivíduos compreendidos como seres que têm uma existência particular no mundo; isto é, sujeito, na perspectiva em discussão, não é um ser humano individualizado... um sujeito discursivo deve ser considerado sempre como um ser social, apreendido em um espaço coletivo (FERNANDES, 2005, p. 33). Para a Análise do Discurso, o sujeito do discurso é histórico, social e descentrado. Descentrado, pois é cindido pela ideologia e pelo inconsciente. Histórico, por que não está alienado do mundo que o cerca. Social, por que não é o indivíduo, mas àquele apreendido num espaço coletivo. “O sujeito de linguagem é descentrado, pois é afetado pelo real da língua e também pelo real da história, não tendo o controle sobre o modo como elas o afetam” (ORLANDI, 2005, p. 20). A Análise do Discurso defende uma teoria não-subjetiva do sujeito. Como explica Fernandes, “a constituição do sujeito discursivo é marcada por uma heterogeneidade decorrente de sua interação social em diferentes segmentos da sociedade” (2005, p. 41). Isso implica três coisas: o sujeito não ocupa uma posição central na formação do discurso; ele não é fonte do que diz; muito menos tem uma identidade fixa e estável. Na perspectiva da Análise do Discurso, a noção de sujeito deixa de ser uma noção idealista, imanente; o sujeito da linguagem não é o sujeito em si, mas tal como existe socialmente, interpelado pela ideologia. Dessa forma, o sujeito não é a origem, a fonte absoluta do sentido, por que na sua fala outras falas se dizem. (BRANDÃO, 1993, p. 92). O que define de fato o sujeito é o lugar de onde fala. Foucault diz que “não importa quem fala, mas o que ele diz não é dito de qualquer lugar” (2005, p. 139). Esse lugar é um espaço de representação social (ex: médico, pai, professor, motorista etc.), que é uma unidade apenas abstratamente, pois, na prática, é atravessada pela dispersão. A unidade é uma criação ideologia, é uma coação da ordem do discurso. Por isso, podemos dizer que o sujeito é um acontecimento simbólico. “Se não sofrer os efeitos do simbólico, ou seja, se ele não se submeter à língua e à história, ele não se constitui, ele não fala, ele não produz sentidos” (ORLANDI, 2005, p. 49).

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sábado, 28 de março de 2009

Introdução a Análise do Discurso

Para a Análise do Discurso, o discurso é uma prática, uma ação do sujeito sobre o mundo. Por isso, sua aparição deve ser contextualizada como um acontecimento, pois funda uma interpretação e constrói uma vontade de verdade. Quando pronunciamos um discurso agimos sobre o mundo, marcamos uma posição - ora selecionando sentidos, ora excluindo-os no processo interlocutório.

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